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Eu, robô? Não…

Do alto de um edifício na cidade de São Paulo, ao olhar uma via engarrafada, cena que se repete todos os dias, conseguimos imaginar o deslocamento humano que acontece em vários grandes aglomerados urbanos ao redor do mundo por causa do trabalho. Só na capital paulista, são cerca de 11 milhões de pessoas que trabalham tresloucadamente em seu cotidiano.

Poderia ser diferente? É possível que sim. Essas pessoas poderiam trabalhar menos, de maneira menos sofrida, se repartíssemos o que é produzido. A não repartição leva a duas situações: quem acumula quer continuar acumulando, e quem não tem precisa se mobilizar mais para ter alguma possibilidade de sobrevivência.

A divisão social do trabalho abordada pela sociologia, especialmente pelo francês Émile Durkheim, traz a percepção de que potencializamos nossas capacidades quando nos dividimos para fazer tarefas diferentes, de maneira a não termos de fazer a mesma coisa. Por trás disso, há sempre um questionamento, como um diálogo interno:

  • Por que faço o que faço?
  • Ora, porque sou obrigado.
  • Mas e se eu não for obrigado a fazer exclusivamente isso? Poderia fazer outra coisa?
  • Se eu tiver escolha, parto para essa outra coisa.
  • Mas por que, em vez de fazer o que faço no trabalho, não vou ser um empreendedor?
  • Porque eu não tenho condição de fazê-lo. Quando tiver o farei.

Onde há o travamento? Na impossibilidade de ação, e então eu cumpro a minha tarefa.

Karl Marx fazia uma distinção muito clara entre os dois reinos da vida: o da necessidade e o da liberdade. No reino da necessidade, eu não posso deixar de fazer aquilo que eu faço, senão pereço. No reino da liberdade, a vida é escolha.

Segundo Marx, existe uma diferença entre ser “livre de” e “ser livre para”. Se você não for livre da fome, da falta de abrigo, da falta de socorro médico, você não é livre para outras escolhas. Uma parcela das pessoas é livre da miséria, da penúria, da carência, e é livre inclusive para dizer “não vou ter um trabalho regular”, “vou viajar”.

Para ser um mochileiro, é preciso ser livre de uma série de outras restrições. Não adianta imaginar que um menino pobre da periferia de uma metrópole colocará uma mochila nas costas e viajará para a Austrália. Um garoto de família mais abastada seria capaz de fazer isso. Porque ele tem contatos, já armazenou na sua mochila vivencial uma série de ferramentas que o permitem essa experiência, porque é privilegiado. Para o outro não há escolha, ou trabalha ou morre.

(…)

**Trecho retirado do livro “Por que fazemos o que fazemos?”

Texto do sempre excelente Mario Sergio Cortella

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Rodrigo Afonso
Rodrigo Afonso
Sim, eu que mando na bagaça aqui.

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